Ivana Maria França de Negri
Nos idos de 1942, meu pai, Geraldo
Victorino de França, entrou na faculdade de Agronomia, na então Escola Agrícola
Prática de Piracicaba, fundada em 1901. Nem imaginava que seria professor na sua
querida Escola, por décadas depois de formado.
Era motivo de muito orgulho para as
famílias ter um filho estudando nessa instituição.
Meu avô tinha uma imensa fazenda lá
pelos lados de Barra Bonita, e meu pai cresceu vendo os colonos arando a terra,
fazendo o cultivo e depois a colheita. Estava sempre em contato com a terra e
isso o fez criar amor por esse trabalho. Foi quando optou por cursar engenharia
agronômica.
Veio para Piracicaba com 17 anos e
foi morar numa das famosas “repúblicas”, como eram chamadas as casas de
estudantes. A dele ficava na rua José Pinto de Almeida e os estudantes, eram
dez na república, iam de bonde para a Escola Agrícola. Como eram muitos os
usuários desse transporte, colocavam um reboque. Meu pai contava que era uma
farra, e muitas vezes os estudantes praticavam o “balancê”, que consistia em
balançar o reboque até tirar a composição dos trilhos, o que acarretava grande
atraso na chegada.
As repúblicas ostentavam na entrada
o famoso “A” encarnado, símbolo da Escola. Os veteranos de outros anos, ditavam
as ordens. Assim que chegava um novo morador, batizavam-no com um apelido que o
acompanharia até o final do curso. Muitas vezes, o apelido perdurava pela vida
toda. Era dado de acordo com as características físicas, lugar de onde veio, defeitos
ou aptidões.
Apelidos como Caolho, Perneta,
Catatau, Magrelo, Nescau, Baleia, Cabeção, Capiau, poderiam hoje em dia
caracterizar bullying, mas na época nem se cogitava uma coisa dessas. E essa
tradição existe ainda hoje. Os “bixos” recebem os chapéus de palha já com seus
apelidos gravados. E não há repetição
deles.
Logo no início, era praxe o primeiro
corte dos cabelos e os trotes, que eram marcantes, alguns até violentos. O
trote acadêmico era uma espécie de prova de fogo. Uns levavam na brincadeira,
mas outros, talvez mais tímidos, ficavam atemorizados e marcados para sempre. Hoje
em dia estão proibidos.
Havia também a famosa passeata dos
calouros, uma espécie de Banda do Bule, onde os novatos, obrigados e
embebedar-se, saíam vestidos de mulher ou com sátiras a governos ou fatos da
época. Essa passeata era um evento muito aguardado e marcante.
Meu pai conheceu minha mãe, uma
jovem professorinha, no jardim da praça central. E iniciaram o longo namoro que
durou oito anos até o casamento.
Os estudantes da Escola Agrícola
eram chamados de “agricolões”, e eram considerados ótimos partidos pelas famílias
das moças em idade de se casar. Hoje,
os estudantes se denominam Esalqueanos.
Existiam
e creio que nos dias de hoje também, os jogos esportivos interrepúblicas, e
muitas festas nas repúblicas e na Casa do Estudante. Mas os bailes de formatura
eram mesmo os mais ansiosamente aguardados, com muita pompa e beleza. Todos
usavam trajes de gala, e as orquestras tocavam até o sol raiar.
Contam que muitos estudantes namoricavam
por aqui enquanto faziam o curso, mas no dia da formatura, traziam suas noivas
oficiais de suas terras natais causando muito choro e decepção.
Como diz a música, velhos tempos, belos
dias...
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